O público do Portal Camisa12 não me conhece. Mas eu trabalhei anos num dos maiores jornais em Portugal. As principais competições em que eu trabalhava eram a primeira e segunda liga portuguesa, além da Champions, Liga Europa, etc.
Com a mudança de emprego passei a acompanhar divisões inferiores. A terceira, quarta e até a distrital. Para o brasileiro entender, as divisões distritais em Portugal são amadoras, divididas por distritos (aí, talvez em Estados). E fiquei surpreendido.
Os clubes que competem nestas divisões inferiores em Portugal são pequenos, muito pequenos. Podem ter boas estruturas, serem organizados e muitos deles têm milhares de adeptos, mas são pequenos.
Confesso que sempre os desvalorizei, nunca quis bem saber. Mas quando comecei a acompanhar de perto, percebi porquê há tanto amor. O clube não representa só 11 jogadores em campo, mas sim uma vila, cidade ou simples terra inteira. Criam identificação com a população e nada mais importa do que “o clube da tua cidade” vencer.
Em Portugal, é o Benfica, FC Porto ou Sporting que dominam a grande maioria da população, então sair dessa bolha e experienciar o sentimento que outras populações têm por clubes menores, é satisfatório.

Nos clubes grandes há uma divisão. As pessoas juntam-se, mas em pequenos grupos, porque se conhecem. Nos clubes da terceira ou quarta divisão, as pessoas juntam-se porque são da mesma terra ou da mesma cidade. Estão interligadas por
algo maior, não só pela circunstância.
Se reúnem famílias, grupos, crianças, idosos, todos a conviver, a falar da vida, do futebol, de como foi ou vai ser a semana de trabalho. Acima de tudo, sente-se o companheirismo, a amizade, o amor partilhado por umas cores de um emblema.
Depois de ter estado lado a lado nas principais competições internacionais e portuguesas, e agora descer nas divisões, sinto-me mais próximo ao futebol, às pessoas, àquilo que é a gênese da competição, ao invés do grande mediatismo e, por vezes, circo que se cria à volta do desporto.
Ganhei gosto por me sentar em bancadas de pedra, ao sol, ainda com restos da chuva da noite anterior. Por pessoas simples, que pouco cantam, mas estão no estádio todas as semanas. Pelas crianças a correr e os pais a assistir ao jogo. Por aquele insulto engraçado e fora do comum ao árbitro ou ao jogador.
Não consigo contabilizar as vezes que, nas últimas semanas, ouvi: “oh burro!”, mas sei que me ri muito, respeitosamente para com os árbitros, claro. Faz parte.
Estes dias entrevistei dois senhores, um com 85 anos e um com perto de 90. Desde os 6 ou 7 anos que acompanhavam o clube em questão, da quarta divisão portuguesa. Foram jogadores, diretores e, acima de tudo, adeptos. Todas as semanas naquele estádio.
Isto é uma vida dedicada a um clube. Perguntei a eles como se explicava ter tanto amor por um clube de futebol passadas tantas décadas, mas sinceramente nem queria uma resposta.
Há sentimentos que não têm de ser explicados ou não têm explicação, mesmo. De qualquer forma, deixo o leitor com a resposta do visado senhor: “é uma doença que não é fácil de curar”.








